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Satã: a construção do personagem

Não é de hoje que estudiosos apontam: a história original do Diabo foi deturpada ao longo dos séculos, até pintar o retrato maligno que conhecemos hoje. Veja, a seguir, um pouquinho de como isso aconteceu.

Texto • Redação

O maior vilão de todos os tempos adentrou a História sob uma personificação bastante diferente da imagem caricaturada que o imaginário popular tem hoje: os demônios são descritos, no Velho Testamento, como auxiliares de Deus, incumbidos da tarefa de pôr em teste a devoção dos homens.
Foi só posteriormente à gênese da Igreja que o termo “demônio” tornou-se sinônimo de um príncipe das trevas, responsável por castigar as almas dos pecadores. No livro Satã: uma biografia (Editora Globo), o norte-americano Henry Ansgar Kelly expõe uma análise detalhada dos livros canônicos, revelando todo o processo que criou a ideia do demônio assustador, com rabo e chifre – que não existe em passagem alguma das Escrituras. Acompanhe, a seguir, um pequeno trecho da obra.
 
O verdadeiro Satã
A atualização mais importante que aconteceu na história de Satã é a completa reinterpretação do Satã do Novo Testamento (…) como um rebelde contra Deus. Esta interpretação, mais do que qualquer outra, confundiu a história de Satã, transformando-o de um simples e detestável funcionário do Governo Divino em uma personificação do Mal – uma personificação que existe de fato como pessoa. Porém, se Satã não é o inimigo de Deus no Novo Testamento, o que ele é? (…)
Em uma das passagens do Novo Testamento, Paulo descreve um episódio ocorrido no centro urbano de Corinto, que dá a Satã um outro rosto. Ao proclamar um julgamento solene de excomunhão para um cristão submetido ao pecado, ele instrui a congregação da seguinte maneira: “Seja esse homem entregue a Satã, para a destruição de seu corpo, a fim de que sua alma seja salva no dia de Nosso Senhor Jesus Cristo”, (1 Cor 5,5). Assim, fica bastante clara a atribuição da função de “penitenciária” a Satã. Ele está encarregado de punir as pessoas que lhe são entregues pelas autoridades locais (nesse caso, os líderes da comunidade cristã). A ação de Satã envolve punição corporal, mas não capital, já que visa à reabilitação.

(…) Minha tese é que a deterioração do personagem de Satã apresentado na Bíblia é simplesmente o resultado natural da “atenção desfavorável da mídia”, o tipo de situação que acontece com qualquer personagem impopular. A deterioração que acontece na época pós-bíblica, quando Satã foi finalmente interpretado desde o início como um rebelde e um desterrado e no final como praticamente um anti-Deus, nada mais é do que uma extensão desse desenvolvimento interno.

Fonte: Triada.com.br