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Aprenda com o Odù Ogbè-Ògúndá

Na cultura de Ifá, a sabedoria dos povos yorùbás é riquíssima. Encontramos em diversos Odù vários versos e histórias que nos ensina diversas reflexões valiosas.

Para cada Odù há diversas histórias diferentes, algumas chegam a ser tão ricas que se torna tão oportunos seus ensinamentos para pessoas regidas até mesmo por energias diferentes.

• INTRODUÇÃO

Antes de darmos início ao estudo da liturgia sagrada de Ifá, preciso esclarecer alguns pontos importantes;

1. Na Religião Tradicional Yorùbá há a crença nos Òrìṣà, que são seres divinizados e alguns deles encarnaram em nosso planeta para ajudar na evolução das civilizações e administração da Terra. Mesmo após a partida para o Òrun (mundo espiritual, similar ao conceito de Olimpo da Cultura Grega, onde vive seres espirituais), eles ainda continuam com a sua presença através de diversos lugares da natureza e podem ser invocados.

2. Os animais não morrem para os yorùbás, há diversos versos de Ifá que revela a existência de vida de animais em outros mundos, inclusive como auxiliares de alguns Òrìṣà. Por isto que muitas mensagens e manifestações dos Òrìṣà podem ocorrer com sinais vindas de animais. Um exemplo emblemático é quem passa por Ẹbọ e acaba sonhando que viu um elefante, ou um búfalo, entre outros animais que tem significados muito importantes ligados à diversas energias e situações vivenciadas no espiritual e material.

3. Da mesma maneira como os cristões possuem suas bíblias, os mulçumanos tem seu alcorão e os judeus a sua torá, os religiosos yorùbás possuem seu corpo literário e que muita das vezes é transmitido via oral dentro do que denominamos tradição familiar.
Os budistas meditam através de parábolas e histórias que trazem reflexões, a mesma coisa são os gregos quando olham para sua mitologia, e na religião de Ifá temos muitos Ìtan (palavra que traz o significado de relato mítico, história ou fábula) e nesta matéria veremos uma delas que confesso que é uma das que eu mais gosto de contar porque serve para regentes de quaisquer Odù.

• VAMOS A HISTÓRIA!

Um certo dia, Ọ̀rúnmìlà estava passando por sérias dificuldades no Àiyé (Terra), também conhecido como ‘mundo visível ou material’ e ao mesmo tempo em um outro universo, no Òrun (céu) havia uma ave chamada Igun (Arbutre) estava passando por vários problemas.

Como Ọ̀rúnmìlà era um sacerdote muito sábio, resolveu não se desesperar e buscou seu oráculo para consultar o espiritual e Ifá orientou que ele deveria fazer um Ẹbọ, mas aquele ritual não poderia ser em apenas um único dia (tudo muito rápido), ele teria que fazer o trabalho durante cinco dias e nestes dias deveria permanecer totalmente de preceito religioso.

A cada dia, Ọ̀rúnmìlà precisava ir até a encruzilhada (Ìkòríta mẹ́ta em yorùbá) e entregar o Ẹbọ, uma oferenda que era direcionada aos ancestrais da Terra.

Era bastante cansativo toda ritualística, pois ele precisou dedicar vários dias, mas Ọ̀rúnmìlà tinha muita paciência e não pensou duas vezes, se dispôs a se sacrificar oferecendo sua fé e esforço para buscar uma possibilidade de melhoria.
Ao mesmo tempo, no Òrun, Olódùmarè (Deus) estava preocupado com um de seus filhos, o pássaro Igun, que estava doente, com problemas nas patas, nas asas, bicos, enfim, ele tinha cinco problemas. E Olódùmarè foi orientado a enviar o seu filho para Terra, porque a sua sabedoria afirmou que chegando na Terra ele encontraria uma solução para o seu problema.
Igun seguindo as ordens de seu pai veio para Terra, porém como ele estava cheio de problemas e sem muitas forças, não conseguiu vir voando e em um de seus momentos ele perdeu controle e veio caindo, ficando exatamente numa encruzilhada e como estava tão fraco, ficou parado nela.

E no primeiro dia do ritual Ọ̀rúnmìlà foi até a encruzilhada levar sua oferenda, prestou suas reverências e disse em voz alta “que toda boa sorte possa chegar em minha vida”, após a entrega, ele foi embora para sua casa. Igun estava escondido e viu tudo que Ọ̀rúnmìlà fez, chegou tão próximo daquela comida e sentiu tanta fome que resolveu comer tudo, passando algumas horas, Igun tinha ficado curado nas suas patas.

No segundo dia, Igun não tinha dúvida, já havia percebido que naquela comida que era deixava na encruzilhada tinha um enorme poder e dedicação, compreendendo que aquela força era capaz de curar qualquer um dos males. Igun ficou escondido e viu que Ọ̀rúnmìlà estava vindo.
Ọ̀rúnmìlà chegou no local, fez a sua entrega fazendo o mesmo pedido e foi embora.
Igun novamente, comeu a comida e de imediato curou suas asas.

No terceiro dia, Ọ̀rúnmìlà que não tinha consciência de nada que estava acontecendo quando ele ia para casa, foi no mesmo local e entregou sua oferenda expressando as seguintes palavras “que toda boa sorte venha para mim”.
Igun continuou observando, ouvindo tudo e quando Ọ̀rúnmìlà foi embora, Igun novamente comeu a oferenda que estava na encruzilhada.
Aquilo foi tão bom que curou mais uma vez uma parte do corpo daquele pássaro.

No quarto e no quinto dia, aconteceu exatamente a mesma coisa, e Igun conseguiu curar as cinco partes de seu corpo que estava com problemas e resolveu ir de imediato, voando, de volta para o céu.

Quando Igun chegou no Òrun, Olódùmarè perguntou ao seu filho o que havia acontecido, pois o pássaro saiu doente e voltou totalmente curado.
Igun relatou que havia um homem de muita sabedoria, humilde, bondoso, que se chamava Ọ̀rúnmìlà pelo o que ele pode perceber estava passando por problemas também, mas todo dia ele ia na encruzilhada e me dava comida, sem saber que eu estava naquele local e sempre dizia “que toda minha sorte chegue até minha vida”, eram expressões sinceras e tão simples, mas que a cada vez que eu comi, uma parte do meu corpo se curava, explicou Igun.

Olódùmarè ficou tão feliz com aquelas verdades ditas por Igun que orientou que deveria em agradecimento, ser enviado para casa de Ọ̀rúnmìlà, os quatro àdò (quatro cabaças com as quatro sortes que existem), Igun expressou que estava de acordo e achava muito justo.

Quando as quatro sortes chegaram a casa de Ọ̀rúnmìlà, ele sentiu aquela presença forte. Èṣù se manifestou como mensageiro e disse:
“Ọ̀rúnmìlà dentro de cada uma destas cabaças se encontram um tipo de sorte, porém você precisa escolher apenas uma, recomendo que você escolha a que melhor for atender as suas necessidades”. Ọ̀rúnmìlà como era muito voltado a família, pediu conselhos de seus filhos e os mesmos aconselharam Ọ̀rúnmìlà escolher a cabaça da longevidade.
Ọ̀rúnmìlà ficou atentado a escolher a cabaça da longevidade e Èṣù como sempre foi um grande amigo, disse para Ọ̀rúnmìlà não escutar seus filhos, pois “eles gostariam que você vivesse muito, porque quanto mais tempo você viver, mais tempo eles viverão dependendo de você e não querendo trabalhar”, disse Èṣù.

As esposas de Ọ̀rúnmìlà ouviram tudo e disse que era melhor para Ọ̀rúnmìlà, escolher a cabaça da prosperidade.
Èṣù mais uma vez ficou informado e disse para Ọ̀rúnmìlà não escolher a cabaça da prosperidade, pois “as suas esposas querem que você escolha a cabaça da prosperidade, para quando você ficar velho, elas apenas fiquem com todos os seus bens”, disse Èṣù.

Ọ̀rúnmìlà estava confuso e não sabia o que fazer, lembrou que Èṣù apoia aqueles que fazem Ẹbọ e resolveu pedir sua opinião. Èṣù sorriu, e disse que Ọ̀rúnmìlà deveria escolher a cabaça da paciência.
Ọ̀rúnmìlà que sempre foi um Òrìṣà de muita sabedoria, não pensou mais e resolveu seguir os conselhos de Èṣù.

Os filhos e esposas de Ọ̀rúnmìlà ficaram extremamente irritados e disse que era uma péssima escolha “o que nós ganharemos com a paciência? Isto não adianta em nada!”, mesmo assim, Ọ̀rúnmìlà não voltou atrás e ficou bem feliz em escolher a cabaça da paciência.

Todas as outras sortes contidas nas outras cabaças resolveram ir embora, começando a voltar para o Òrun. Porém no meio do caminho a Longevidade perguntou para Prosperidade onde estava a cabaça da paciência, e a Prosperidade afirmou que se encontrava na casa de Ọ̀rúnmìlà e que foi aquela que ele havia escolhido.
A Longevidade disse que não poderia voltar para o Òrun e que era de seu dever estar ao lado da Paciência, pois quem tem Paciência, acaba tendo Longevidade.
A Prosperidade também exclamou “onde tem Paciência, é onde deve existir Prosperidade, devo voltar para ficar junto da Paciência”.

E a terceira cabaça que era a Sorte, também resolveu voltar, pois onde tem Paciência, tem a boa Sorte.

Desta forma as três cabaças regressaram para a casa de Ọ̀rúnmìlà e foram ao encontro da Paciência.
Ọ̀rúnmìlà que havia escolhido a Paciência, acabou ficando com mais três: A Sorte, Prosperidade e a Longevidade.

• LEVANDO PARA NOSSA REALIDADE

Podemos perceber que em nosso planeta há muitas coisas boas, mas que antes de qualquer grande conquista, é necessário a compreensão que nem tudo acontece no nosso tempo e que há coisas que não podem ser acalçadas em segundos, existe certos resultados que devem existir no momento certo e que devemos estar aptos de forma paciente para recebê-los.

Existe um provérbio yorùbá: “A paciência é o pai do comportamento“.

Não adianta praticar, se não buscar se tornar uma pessoa paciente. Eu vejo com uma certa constância algumas pessoas que acham que a Espiritualidade somente existe para satisfazê-las e agem como se tivessem domínio do tempo, porém fracassam quando se deparam com a realidade de que certas coisas não acontece exatamente no nosso tempo.

Alguns praticam belos atos, mas por falta de paciência se corrompem, praticando outras coisas que levarão ao regresso. O paciente busca estar receptivo para que a boa sorte possa chegar, entre outras coisas, mas o impaciente se fecha com facilidade e quando as coisas boas poderiam chegar, ele já não se encontra mais receptivo para recebimento daquilo que estava buscando.

Eu procuro ensinar diariamente aos meus aprendizes de que é necessário estar paciente para não perder as oportunidades que virão, pois a boa positividade chega na casa de quem cultiva a paciência.

Desejo profundamente que os leitores deste conteúdo possam refletir sobre suas vidas, analisando se realmente estão aptos para aquilo que julgam-se dignos de tamanha benevolência espiritual, e se este bom comportamento e paciência apenas existe quando estamos ganhando ou também quando estamos em momento de dificuldades e precisamos ter a fé que coisas boas chegará.

Autor: Awo Ifá Leké – Eduardo Henrique Costa.
Professor de Religião & Cultura.
Fundador do Universo e Cultura.




Odù Irete-Osá e o Poder da Coletividade

Tudo na vida é partilha, a força do viver se encontra na união. Se todos derem as mãos, quem cair receberá a força das mãos dos outros aliados. O Culto a Ifá e Òrìṣà possui suas famílias tradicionais e que nos faz refletir de que na vida quem cuida de alguém, também deve ser cuidado(a) por outro alguém, um busca a força no outro. Assim revela os Odùs de Ifá.

Texto – Awo Ifá Leké Eduardo Henrique

Ifá nos ensina que todos nós temos nosso Egbe Òrún (grupo espiritual) ao qual cada um de nósun pertencemos e aqui na terra temos nossos grupos físicos, são exemplos de grupos do Àiyé (terra):
Grupo familiar
Grupo profissional
Grupo escolar
Grupo religioso…
E os versos de Ifá nos mostra que em todos nossos grupos é necessário desenvolver o senso de criatividade e união, para que o grupo realmente seja forte. Em yorùbá conhecemos como ‘idile’ e em português como ‘clã’.
A ideia de clã pode ser entendida como pessoas que se unem, independente das diferenças. É o que escolhemos fazer com pessoas que sejam de nossa confiança. Ifá afirma em diversos Odùs que não podemos agir como traidores, porque não existe força no viver sem a coletividade.

Há um itan neste Odù que conta sobre um sapo que estava em guerra com o búfalo.
O sapo resolve consultar Ifá e sabiamente recebeu como resposta de que ele deveria convocar outros sapos.
Ifá aconselha que a solução é trabalhar em grupo, em união, agindo em coletividade.
O sapo foi orientado a tomar ebó e alimentar seu Egbe Òrún (grupo espiritual) e usar um ikodide (pena vermelha sagrada) e que deveria colocar cada sapo em sua cabeça.
Os sapos resolveram se unir e trabalhar em grupo.
Cumpriram com seus sacrifícios e resolveram ir até a guerra contra o búfalo.
Pela lógica um búfalo é muito mais forte que um sapo e não teria a capacidade de vencê-lo, mas diversos sapos e com uma grande energia positiva foram capazes de vencer o búfalo.

Trazendo para nossa realidade
Há pessoas que mesmo sendo “sapos” se sentem “búfalos” e não sabem reconhecer a importância de um clã. Nos versos do Odù Irete-Osá podemos refletir que o trabalho de vários sapos juntos, foram capazes de vencer o búfalo.
O aconselhamento é que na família, no relacionamento amoroso, não devemos tratar como nossos inimigos aqueles que confiamos, porque isto enfraquece os laços e automaticamente torna ambos fracos.
Ifá mostra que é importante o Poder da Coletividade.

Um pai se tornando inimigo de um filho e o filho se tornando inimigo de seu pai.
O sacerdote que tenta prejudicar seus devotos.
O devoto que age com traição com seu sacerdote.
Uma esposo que só sabe atacar e a esposa que só sabe atacar.
Um trabalhador que tenta atacar seus superiores ou colegas.

Ifá ensina que as pessoas não devem semear a guerra contra seus próprios clãs e devem se unir em prol daqueles que realmente querem prejudicar. O senso de coletividade ajuda a proteger uns aos outros e assim conseguem superar com força as adversidades. Mesmo que em algum momento da vida possamos passar por decepções, traições, não é motivo para desistirmos de pertencer a um grupo, ou se tornar um eremita, para viver isolado ou fechado.

“Quando o rebanho se une, o leão dormirá com fome” (provérbio africano).

Reflexão

Dentro dos grupos que você pertence se considera parte destes grupos? Você procura fazer com que a sua existência individual tenha um valor e um sentido coletivo para beneficiar não somente a sua pessoa, mas ao clã(s) que você faz parte?… Lembre-se que não é porque existe traídores que devemos nos espelhar neles, nós devemos ouvir o que Ifá nos ensina e o que ele nos traz é que devemos trabalhar em grupos, em conjunto com os nossos iguais para vencer os nossos reais inimigos.

Que o grupo espiritual de cada um de vocês, possa fazê-los vitoriosos.




Sangue, sacrifícios humanos e o Culto de Ifá

Aboru Aboye Abosise.
Alguém uma vez me perguntou “por que temos que sempre colocar sangue em Ifa?” Qual é a importância do sangue e o uso em nossa espiritualidade, é a parte das razões pelas quais a maioria das pessoas está fugindo dele.

Em Osa Irosun, a Ifá deixa claro que o sangue é o alvo da nossa espiritualidade.

Em Osa Irosun, Orunmila diz que Ifá está no sangue, quando oferecemos sangue animal para Ifá, todos os problemas são resolvidos imediatamente, em diversos itans (histórias) vemos estas narrativas.

Quando o sangue toca o chão, ele desaparece porque, quando minha mãe me dá à luz, eu estava nadando de sangue enquanto eles se alegravam.

Quando Ifá está falando sobre sangue, é animal que Ifá está dizendo.

Ifá proíbe usar o ser humano como sacrifício. É um TABU !!!

Eu não devo usar um pássaro para fazer um sacrifício para um pássaro.
É proibido pescar um peixe para fazer ebo para o peixe.
É um Tabu usar humanos para oferecer ebó para um ser humano.

Também em Ogunda Irosun, a Ifá também deixa claro que os humanos nunca devem ser usados como sacrifício em qualquer ocasião.

E também quando estamos alimentando Ifá, costumamos cantar que:

Orí eku ni kí o gbà o
Má mà gb’orí Awo o
Orí eja ni kí o gbà o
Má mà gb’orí Awo o
Orí eye ni kí o gbà o
Má mà gb’orí Awo o
Orí eran ni kí o gbà o
Má mà gb’orí Awo o

Tradução
Receba a cabeça do rato
Não colete a cabeça do Awo
Receba a cabeça do peixe
Não colete a cabeça do Awo
Receba a cabeça do pássaro
Não colete a cabeça do Awo
Receba a cabeça do animal
Não colete a cabeça do Awo
Àsè!




A importância do Obi na Tradição Yorùbá

Um dos elementos mais importante utilizado no culto a Orúnmìlá-Ifá e no culto aos Òrìṣà. Nas cerimônias jamais pode faltar Obi, pois além de ser usado como oferenda, serve para comunicação com o Òrún (céu). É conhecido como noz de cola.

Toda vez que visito a casa de meu Babalawo costuma ter mais de cem obis em seu estoque, porque serão usados com frequência nos ebós, iniciações, festivais, orações e muito mais. O Obi costuma ser consumido em algumas cerimônias, é a fonte do bem, símbolo da oração no Òrún e que representa a misericórdia infinita de Olódùmarè. O Obi não é somente usado na África, no Candomblé, assim como no culto de Orúnmìlá-Ifá é imprescindível. Sem ele não é feito nenhum rito, é preciso uma comunicação durante a prática, pois para que o rito prossiga, com aceitação dos Òrìṣà, é preciso uma resposta positiva que será fornecida por meio do Obi.

O Obi é colhido da árvore que recebe o nome científico de Cola acuminata. São árvores de baixa estatura, tronco cinzento, folhagem brilhante. Os frutos são umas capsúlas secas, que se abrem ao secar liberando as sementes. A substância cola, costuma ser usada em xaropes, em bebidas e refrigerantes, é obtida do pó do Obi. Há praticantes que costumam comê-las frequentemente como fonte de energia, devido essas nozes serem ricas em cafeína.

Existe um Itan (história) onde Orúnmìlá revela como o Obi foi criado. Quando Olódùmarè (Deus) descobriu que as divindades estavam se digladiando e, antes de se esclarecer que era o responsável pela beligerância, decidiu convocar as quatro divindades mais moderadas, a Paz (Ibalé Okan), a Prosperidade (Ire Gbogbo), a Longevidade (Ire Aikú) e Àyié, a única divindade feminina presente, para chegarem a um consenso sobre a situação.

Um dos temas discutidos exaustivamente foi sobre o motivo dos jovens não mais respeitarem os mais velhos, como fora ordenado por Olódùmarè.

Todos começaram então a rezar pela volta da harmonia e do equilíbrio fraterno. Olódùmarè abriu e fechou sua mão direita apanhando o ar. Na sequência abriu e fechou sua mão esquerda, novamente apanhando o ar. Logo após saiu e, mantendo suas mãos fechadas, plantou o conteúdo delas, junto com as orações.

No dia seguinte uma árvore havia crescido no lugar onde Olódùmarè havia plantado as orações que apanhou no ar. A árvore frondosa rapidamente cresceu, floresceu e deu frutos. Quando os frutos estavam maduros e prontos para a colheita, começaram a cair no chão. Àyié as coletou e as levou para Olódùmarè e ele falou para ela preparar do modo que ela mais gostasse.

Inicialmente ela tostou os frutos, porém sua textura modificou-se substancialmente, ficando dura e os frutos, com gosto desagradável. No dia seguinte, coletou mais frutos e os cozinhou em água. Elas sofreram alteração de cor e não podiam ser comidos.

Paralelamente, as demais divindades fizeram outras tentativas que, no entanto, se mostraram sem sucesso. Foram então até Olódùmarè para comunicar a tarefa de descobrir como preparar os frutos, que era inviável.

Quando todos já haviam desistido, Elinini, a divindade dos Obstáculos, volutariou-se para guardar os frutos. Todos os Obis colhidos foram confiados a Elinini. Ela quebrou as cápsulas, limpou, lavou os Obis e guardou-os por 14 dias com folhas da árvore, para que permanecessem frescas. Dia após dia, ela comia os Obis crus que havia guardado.

Aguardou mais catorze dias e percebeu que eles continuavam vigorosos e frescos. Em seguida, Elinini levou as frutas para Olódùmarè e disse a todos que o produto das orações, o Obi, poderia ser comido sem nenhum perigo.

Como foi Elinini, a mais velha divindade em sua casa, que conseguiu descobrir o segredo do produto das orações, Olódùmarè então decretou que os Obis deveriam, daquele dia em diante, não seriam apenas alimento do Òrún, mas também em todo local sagrado. Deveriam sempre ser oferecidos inicialmente aos idosos do grupo e também o seu consumo deveria ser sempre precedido por orações.

Olódùmarè também determinou que, como um símbolo de oração, a árvore somente cresceria em locais onde as pessoas respeitassem os mais velhos.

Naquela reunião do Conselho Divino, o primeiro Obi foi partido pelo próprio Olódùmarè e continha duas partes. Ele pegou uma e ofereceu a outra para Elenini, a mais antiga divindade presente.

O Obi seguinte tinha três partes, os quais representavam três divindades masculinas que proferiram as orações que fizeram nascer a árvore do Obi.

O próximo tinha quatro peças e incluía assim Àyié, a única mulher que estava presente na celebração.

O próximo tinha cinco partes e incluiu Òrìsàla.

O último Obi tinha seis partes representando a harmonia, o desejo das orações divinas. Esse Obi com seis partes foi repartido e distribuído entre todos os membros do Conselho.

Àyié trouxe Obi para a Terra, onde sua presença é marcada por orações e só germina e floresce em grupos humanos em cujos quais os mais velhos e os ancestrais são respeitados e onde a tradição é glorificada.

Um outro fruto sagrado muito utilizado no culto aos Òrìṣà, podendo até ser para substituir o Obi, é o Órogbó (Garcinia Kola). É bastante utilizado nos rituais e oferendas de Orúnmìlá-Ifá, Sàngó, Òsonyin e outros Òrìṣà masculinos.

Autor: Awo Omo Ifá Leké – Eduardo Henrique. Professor e pesquisador da cultura africana.

Fonte consultada:
Adekunle, Otunba, Ifá Filosofia e Ciência de Vida. 1.ed. São Paulo, 2005.




Documentos sobre religiões africanas

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A cultura africana é muito rica em conhecimentos, costumes, mitologias, ritos e crenças. Em diversas cidades da África encontramos uma diversidade de costumes e tradições. Com o intuito de mostrar as belezas e todo este lado maravilhoso que envolve o caminho religioso, encontre nesta matéria diversos links de documentos compartilhados por usuários.

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A Cultura Religiosa Dos Iorubás Do Surgimento à Diáspora

A Imortalidade Iorubá

Calculo Opele

Concepção Ioruba da Alma, William Bascom

Cultura Iorubá – Costumes e Tradições, Maria Inez Couto de Almeida (Ifatosin)

Esú – A Pedra Primordial da Teologia Iorubá

O Exu Desvendado

Odu-apostila de jogo de buzios

Ose Oyeku – Como os Orisa deram nascimento a Igbadu, Pierre Verger

Predestinacao e a Metafisica de Identidade Ioruba, Yunusa Kehinde Salami

Sobre Obatala

Solagbade Popoola e o Novo Mito Ioruba da Criacao do Universo, Luiz L. Marins

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Mitologia dos Orixás

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Resumo do livro: Mitologia dos orixás, do sociólogo Reginaldo Prandi, é a mais completa coleção de mitos da religião dos orixás já reunida em todo o mundo. São 301 relatos mitológicos, histórias que contam, por meio de imagens concretas e não de idéias abstratas, como são, o que fazem, o que querem e o que prometem os deuses desse riquíssimo panteão africano que sobreviveu e prosperou em países da América – em particular no Brasil e em Cuba – e que nos últimos anos tem sido exportado para a Europa. Na sociedade tradicional dos iorubás, é pelo mito que se alcança o passado, se interpreta o presente e se prediz o futuro. Cada mito, portanto, é uma surpresa sempre renovada, um segredo revelado que jamais se deixa desvendar completamente. Ao narrar episódios em que se envolveram deuses como Exu, Ogum, Iemanjá e Iansã, Mitologia dos orixás chama a nossa atenção para sentidos vitais profundos e nos aproxima do vasto patrimônio cultural dos negros iorubás ou nagôs. O livro é ricamente ilustrado, com fotos coloridas de todos os orixás que se manifestam em cerimônias do candomblé no Brasil e ilustrações do artista plástico Pedro Rafael.

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Caminhos De Odu

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Resumo do livro: Os odus do jogo de búzios com seus caminhos, ebós, mitos e significados, conforme os ensinamentos escritos por Agenor Miranda rocha em 1928 e por ele mesmo revistos em 1998. Contém os itãs (histórias) dos 16 principais odus do jogo de búzios que ajudam o babalaô a orientar o consulente.

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Odù Ogbè Ọ̀sá.

Olódúmarè : A mão que abençoa jamais pode amaldiçoar (Ogbè Ọ̀sá)

O texto a seguir foi retirado da tradição Cubana do Odù Ogbè Ọ̀sá.

É um pataki sobre a traição do carneiro contra Oya, fato que definiu uma relação com abrangência sobre toda a religião.

O significado é muito rico e não se pode deixar de refletir sobre o seu conteúdo.

Como toda metáfora, mais do que a estória que define a separação entre Oya e Carneiro, esse texto diz que uma mão que já abençoou uma outra jamais poderá amaldiçoar.

Não se deve levantar a mão, ou acender uma vela que não seja para o bem de uma pessoa que o abençoou um dia.

Isso define de uma forma muito definitiva a relação que deve existir entre pessoas nessa religião.

É muito comum pessoas que foram muito ligadas se desentenderem e depois ficarem trocando issultos e feitiços.

Infelizmente essa é a grande ética que existe nos membros dessa religião.

Contudo se a relação entre duas pessoas já foi maior do que apenas amizade se estamos lidando com filhos e padrinhos ou com filhos e babalorixás, então, jamais nem um nem outro deve levantar sua mão.

Deixe para Olódúmarè resolver essa questão no julgamento dele.

Oya e o Carneiro foram uma vez os melhore amigos.

Ela confiava a ele todo os seus pensamentos, seus medos e seus segredos.

Até quando ela não tinha como contar com um Orixá, lá estava o Carneiro para ajudar e ela o amava acima de todas a coisas.

Os inimigos de Oya colocaram um prêmio por sua cabeça; Suas andanças pelo mundo causam problemas para eles e eles colocaram um prêmio por sua cabeça.

O Carneiro ouviu rumores dos seus anseios, mas como a estória foi passando entre todos na terra, a estória mudou.

O que o Carneiro ouviu foi que Olorun, ele mesmo, queria destruir Oya, e ele estava oferecendo o presente da imortalidade para aquele que a trouxesse ao seu palácio.

Em cobiça o Carneiro foi até Olorun e disse-lhe. “pai, eu tenho ouvido sobre seu ódio por Oya e eu posso trazê-la aqui para você.

Eu posso enganá-la e você poderá ter a cabeça dela como você quiser”.

Olorun ficou abalado. ele, também, tinha ouvido que Oya tinha grande inimigos que queriam a sua morte.

Ele também tinha ouvida que entre todas as coisas sobre a face da terra a que ela mais amava era o carneiro.

“- e como, Olorun perguntou, você será capaz de trazê-la para mim?”.

“- É simples meu Pai”, ele disse. “

Oya confia em mim a sua vida, nós somos os melhores amigos que existe.

Eu a trarei à você assim que você concordar em me dar o prêmio que ofereceu por ela” .

“- E o que poderia isso ser, carneiro?”.

“- A vida eterna. Isto foi o que você prometeu, não é?”

Olorun ao ouvir isso ficou furioso, mas sua face estava calma.

“- Carneiro, ele disse, traga Oya para mim e eu lhe darei o que deseja, vida eterna.

Falhe e no lugar da cabeça de Oya eu irei ter a sua”.

Ele dispensou o carneiro; tão logo o animal deixou seu palácio, Olorun transportou a si mesmo para a casa de Oya.

“- Oya, ele alertou-a, você tem muitos inimigos que desejam a sua cabeça.

Mas, nenhum deles pode trair você como seu melhor amigo.

O carneiro está vindo para entregar você nas mãos deles.

Você não pode deixá-lo te destruir” .

“- Pai, ela disse desacreditando, certamente você está brincando.

Ele é meu melhor amigo, aquele no qual eu acredito acima de todas as coisas”.

“- Isto é verdade, Oya.

Ele irá oferecer a você um lugar seguro e ao invés disso ele a trará até mim.

Para, você ver, o carneiro acredita que eu quero a sua cabeça, e ele me veio hoje oferecer trazer você até mim.

Em troca da sua cabeça ele quer a vida eterna”.

A raiva soou como um sino dentro de Oya, tomando conta de si e fazendo o seu sangue ferver.

Olorun estava além da mentira, mas o carneiro era o seu maior amigo.

Ele sabia todos os seus segredos.

Os relâmpagos brilhavam em seus olhos quando ela disse: “- Eu irei destruí-lo!”.

“- Não Oya” ele a acalmou com sua voz gentil. “amigos jamais podem trair amigos e você não pode maldizer a quem um dia você abençoou.

Quando o carneiro vir para trair você, você vá com ele.

Mas antes coloque seus 9 ides de cobre em uma caixa.

Assim que você chegar nos muros do meu palácio, sacuda a caixa vigorosamente e um enorme redemoinho ira descer do céu e tirar com segurança do caminho.

Meus guardas irão prender o carneiro nos muros do palácio e eu mesmo irei puní-lo por esta traição.

Ele sabe que o custo da falha e grande e eu mesmo irei tirar a sua cabeça com minhas mãos.”

Olorun parou por um momento e então ele abraçou Oya.

” Minha filha, os seres mortais fazem coisas estranhas devido a cobiça.

Mas o carneiro sabe que você o ama.

Talvez mesmo agora ele esteja repensando este seu plano vil.

Talvez ele não venha.

Talvez ela não trai você.”

Ouve então ou ruidoso barulho na porta de Oya.

“- É ele, disse Olorun, “Eu preciso ir”, E sua figura se desmanchou no ar.

Oya abriu a porta, e o carneiro, agitado e desesperado por dentro, “Minha amiga”, ele disse com sua voz embargada, ” – seus inimigos estão vagando na floresta e são muitos.

Ele irão vir aqui para matar você. Venho comigo e eu irei levá-la a um lugar seguro”.

Ela controlou sua raiva e rapidamente disse “- Eu preciso pegar uma coisa primeiro” .

” Não temos tempo!”

MAs antes que ele pudesse dizer mais alguma coisa Oya estava em seu quarto. Ela colocou nove idé de cobre em uma caixa, como Olorun disse e montou nas costas do carneiro.

” Certamente isto não está acontecendo, ela pensou, talvez… o carneiro esteja me pegando para levar longe de Olorun”.

Em um instante o Carneiro estava correndo pela floresta com Oya nas suas costas.

O caminho familiar não deixou dúvida para Oya e ela finalmente acreditou que ele a estava levando para Olorun.

Os portões do palácio cresceram na frente deles e Oya como Olorun havia instruido, sacudiu a caixa vigorosamente.

Um imenso tornado desceu e levou Oya com ele para os céus, longe da visão do carneiro. Ele congelou.

Assim que o tornado se foi ele foi rodeado pelos guardas de Olorun que o trouxeram diante do trono.

CARNEIO, gritou o normalmente gentil Olorun, ” Você se envolveu em grandes crimes hoje.

Você buscou destruir sua melhor amiga, aquela que o amava acima de todas as coisas. Você pensou que eu queria a cabeça de Oya.

Eu a amo asim como amo todas as minhas crianças na terra. Oya tem muitos inimigos, isto é verdade, mas nunca eu fui o seu inimigo. Eu jamais poderia trair aquilo que eu uma vez abençoei.

A ira de Olorun cresceu e encheu a enorme sala.

” Pelo motivo de você estar desejando entregar uma de minhas mais amadas filhas nas mão frias da morte, eu sentencio você carneiro à morte.

Sua cabeça é minha assim como todas a cabeças pertencem a mim.

Eu irei tomar a sua cabeça agora!.

Eu foi assim que o carneiro encontrou a morte devido à sua traição a Oya.

Sua cabeça foi enviada aos inimigos de Oya como um sinal de Olorun que ele mesmo jamais iria tolerar que qualquer coisa fosse feito à ela.

Os inimigos de Oya fugiram e ela nunca mais foi traída novamente.

Desde esta traição, Oya jamais estará na mesma sala com o carneiro que foi uma vez o seu melhor amigo, seu confidente e tentou destruí-la.

Por causa desta estória, os filhos de Oya jamais coroarão filhos de Yemanjá e Xango e também estes Orixás poderão coroar filhos de Oya.

O motivo não é uma guerra entre eles, mas o fato deles comerem carneiro.

Assim em qualquer sala que exista uma Oya não poderá haver um assento cujo Orixá tenha comido carneiro.




Odù – A sabedoria de Olódùmarè

Os Odùs foram criados por Olódùmarè (Deus Supremo), sendo a forma do divino compartilhar a sua sabedoria com os seres. Estudiosos afirmam que o nome de Olódùmaré possui ligação com a palavra Odù, trazendo como reflexão que ele é o grande criador dos Odùs.

• Texto • Awo Ifá Leké – Eduardo Henrique Costa

A sabedoria de Olódùmarè chamamos de Ifá. Quando o Deus Supremo, os Òrìṣà possuem alguma dúvida eles vão diretamente a Ifá (a própria sabedoria de Deus), para poder obter devidas respostas e conhecimento, não somente no plano espiritual, mas também no plano físico. Olódùmaré compartilhou Ifá (sua sabedoria) com o Òrìṣà Orúnmìlá, este compartilhou com as demais divindades e com os seres humanos, onde teve origem a sua religião.

O significado da palavra Odù, muitos traduzem como “destino” por entender que teria ligação com caminhos, outros comparam com os horóscopos e numerologias e preferem chamar de “signo”, o que é muito visto em Cuba, mas a realidade é que se fôssemos trazer para o português brasileiro, podemos afirmar que se refere a algo amplo, algo infinito. Em cada Odù habita diversas energias, são diversas possibilidades de caminhos a serem percorridos, várias predestinações, o que pode ser algo bom ou ruim, dependendo em que posição se encontra os nossos Odùs regentes.

Algumas pessoas por não saberem lidar com seus Odùs ou por terem o costume de não seguir as orientações vindas de Ifá, possui muitos problemas, devido os Odùs estarem negativos, o que infelizmente acabam acreditando que aquele Odù é ruim, mas na realidade não é! Os africanos acreditam que não existe Odú ruim. Os mesmos são cercados de coisas belas e feias, boas e ruins, o que vai definir o que possívelmente iremos vivenciar com mais frequência, é a forma como conduzimos e se estamos negativos ou positivos. O lado ruim que se encontra nos Odùs não significa que iremos vivência-los, eles servem como alertas e de como devemos agir para evitar aquela predestinação.

Dentro de cada Odù transita diversas energias, é morada de diversas possibilidades. Ter acesso a Odù é ter acesso ao conhecimento e diversas informações, que são capazes de entender o que vem acontecendo, como devemos resolver e até mesmo quem é a divindade daquela pessoa. É através deles que os Òrìṣà trazem respostas ao sacerdote ou sacerdotisa, sobre o que Olódùmarè julga como importante a ter como informação. É muito comum ao se consultar com frequência, perceber que os Odùs do oráculo podem ser os mesmos ou diferentes, pois tudo dependerá de como se encontra naquele exato instante aquele indivíduo ou questão.

Os Odùs de consultas não são vitalícios e, por isso, podem mudar constantemente, sendo o mesmo em fase boa ou ruim, ou um completamente diferente. Quando alguém nasce, os Odùs daquele nascimento explicam como os pais devem cuidar daquela criança e quais cuidados devem ter durante a jornada, numa iniciação religiosa, os Odùs que aparecem são os que vão irão explicar como será o caminho religioso daquela pessoa. E para apurar quais são os Odùs é necessário consultar algum dos oráculos. Existe um erro que muitos cometem ao associar Odù com numerologia e esoterismo, achando que ao somar número por número da data de nascimento terá os Odùs daquela pessoa, ou daquele lugar, mas tradicionalmente não funciona desta maneira. Existe diversos tipos de calendários, chinês, maia, grego (que é um dos mais usados), além de existir o próprio calendário iorubá, o que é impossível ter acesso aos Odùs que é algo tão amplo e não dá através de uma somatória, o que não é considerado uma apuração, pois não se baseia na situação atual e nas energias que estão regendo aquele exato momento.

Òrìsà Pepe. Um oráculo dos caçadores e guerreiros, é uma esteira que responde perguntas de sim ou não.

Na religião tradicional iorubá, possui diversos tipos de oráculos, como os obis, orogbo, Òrìṣà Pepe, entre outros, o que não devemos achar é que todos apuram ou possuem Odùs. Apenas três oráculos trabalham com Odùs, que é através dos jogos de Òpèlè Ifá (conhecido por alguns como “rosário de Ifá”), dezesseis búzios (conhecido como “Mérìndilogún”) e Ikins Ifá.

O que é bastante oportuno trazer como observação é que os Odùs dos jogos de búzios não são os mesmos do que nos outros dois tipos de jogos citados, embora possam possuir nomes semelhantes, os versos, interpretações, histórias e procedimentos são totalmente diferentes.

Imagem: Babalawo Ifaolaifa – Alberto Junior. Para visualizar em melhor qualidade, clique na imagem.

Em cada Odù, encontramos reflexões e histórias valiosas que nos ajudam nas determinações, vejamos um exemplo:

O Odù Ogbe Irete traz reflexões sobre a lealdade. Segundo este Odù, Orúnmìlá tinha dúvida sobre a amizade e lealdade dos outros Òrìṣà. Orúnmìlá pediu para seus filhos que anunciassem, falsamente, pela cidade, que ele havia morrido. Foram à casa de todos os Òrìṣà para comunicar o falecimento do Grande Adivinho. O que os filhos perceberam nas reações dos Òrìṣà foi a indiferença. Faltava a casa de Èsù. Este, quando recebeu a notícia, demonstrou profunda tristeza, pois considerava Orúnmilá um grande amigo e era muito grato pela ajuda que lhe dispensava. Ele nunca havia raspado sua cabeça e, como tributo ao amigo, pediu aos discípulos para fazer isso. Os filhos de Orúnmìlá foram contar ao pai o fato que ocorria na casa de Èsù. Orúnmìlá pediu aos discípulos que fossem imediatamente à casa de Èsù para interromper a raspagem, explicando que ele não estava morto e que aquilo era uma encenação para conhecer a lealdade e amizade dos Òrìṣà, porém a sua cabeça já estava quase toda raspada. A partir de então, o Grande Adivinho determinou que não manteria amizade com os outros Òrìṣà e que seria apenas amigo de Èsù, o único que demonstrou lealdade verdadeira.

Autor: Awo Ifá Leké – Eduardo Henrique Costa

Professor e pesquisador sobre religiões africanas e afro-brasileiras, fundador do Universo e Cultura.




Sabedoria dos Odus de Ifá e seus versos

Naquele tempo, Ọrúnmìlà não era mais que um jovem, de excepcional possuía apenas a vontade imensa de saber tudo o que pudesse.
Em suas andanças sobre os países então conhecidos, soube da existência de um grande palácio, onde havia 16 quartos, num dos quais encontrava aprisionada uma belíssima donzela denominada Sabedoria.
Muitos jovens aventureiros, guerreiros poderosos, príncipes e monarcas já haviam sucumbido na tentativa de resgatar a bela jovem.
Determinado a conquistar Sabedoria, Ọrúnmìlà dirigiu-se ao local onde estava edificado o palácio e no caminho encontrou um mendigo que lhe estendeu a mão pedindo um pouco de comida. Colocando a mão em seu embornal, Ọrúnmìlà dali tirou um pequeno saco com farinha de inhame, que era tudo que tinha para comer e de uma cabaça um pouco de epo (dendê), misturando tudo e dividindo com o mendigo, comendo uma pequena parte do alimento.
Depois de alimentar-se, o mendigo revelou a Ọrúnmìlà o seu nome, dizendo que se chamava Èṣù e como agradecimento ofereceu ao jovem aventureiro um pedaço de marfim entalhado, dizendo:
“Com este marfim denominado Iroke ifá deverás bater em cada uma das 16 portas do palácio, pois só assim elas se abrirão”. Do interior de cada quarto ouvirá uma voz que te perguntará ‘quem bate? ’. Você se identificará dizendo que é Ifá, o senhor do Irofá. Pois só assim cada uma revelará o seu segredo.

A primeira porta – Èjì Ogbè
Representa o conhecimento da vida.
A voz perguntará então: O que está procurando? E você dirá, estando diante da porta do primeiro quarto, que deseja conhecer a vida, a competição entre os homens e que quer conquistá-la em nome de Èjì-Ogbè, o princípio de tudo. A porta então se abrirá e conhecerá os segredos da vida.
A segunda porta – Ọ̀yẹ̀kú Méjì
Representa o conhecimento sobre a morte.
No segundo quarto, quando a voz te perguntar o que deseja, depois de ter se identificado como antes, dirá que deseja conhecer Iku, a Morte e que deseja dominá-la. Aprender a dependência das almas com a Morte e a reencarnação por intermédio de Òyẹkù Meji. Então a porta se abrirá e você conhecerá a Morte, seus horrores e seus mistérios. Se não demonstrar medo em sua presença irá adquirir o domínio absoluto sobre ela.
A terceira porta – Ìwòrì Méjì
Representa o conhecimento da vida espiritual com as forças do Ọ̀run.
Na terceira porta encontrará um guardião denominado Ìwòrì Méjì, o anjo exterminador que, depois de reverenciado, colocará diante dos seus olhos a determinação do criador sobre a Terra, os mistérios da vida espiritual e dos nove espaços do Ọ̀run, onde habitam deuses e sombras e todas as classes de espíritos que irá conhecer.
A quarta porta –Òdi Méjì
Representa o domínio da matéria sobre o espírito.
Na quarta porta você reclamará por conhecer o domínio da matéria sobre o espírito, à lei do Carma e a formação do gênero humano. O guardião desta porta chama-se Òdi Méjì, a quem deverá demonstrar respeito e submissão. É necessário que não se deixe encantar pelas maravilhas e os prazeres que se descortinarão diante de teus olhos, pois podem te escravizar para sempre, interrompendo sua busca.
A quinta porta – Ìrosùn Méjì
Representa o domínio do homem sobre seus semelhantes.
Na quinta porta quando for indagado dirá, diante de Ìrosùn Méjì, que procura o acaso da vida. O domínio do homem sobre seus semelhantes através do uso das forças físicas e imposições dos homens. Aprenda, mas não utilize jamais as técnicas reveladas para o mal. Apenas como defesa, para não se tornar vítima delas.
A sexta porta –Ọ̀wọ́rin Méjì
Representa o equilíbrio que deve existir no Universo.
Na sexta porta será recepcionado por um gigante do sexo feminino que deve ser saudado por Ọ̀wọ́rin Méjì a quem solicitará ensinamentos relativos à possessão espiritual, à cura dos seres vivos e ao equilíbrio que deve existir no Universo. Compreenderá então o valor da vida e a necessidade da morte, o mistério que envolve a existência das montanhas e das rochas. Ali será tentado pela possibilidade de obter muita riqueza, mulher, filhos e bens incomensuráveis. Resista a estas tentações ou verá ser reduzida a uns poucos dias de luxúria.
A sétima porta –Ọ̀bàrà Méjì
Representa o poder da realização dos desejos e sonhos do ser humano.
Agora estará diante da sétima porta. O habitante deste quarto chama-se Ọ̀bàràMéjì, é velho e se apresenta de aparência bonachona. Poderá te ensinar prestígios da cura, soluções para os problemas mais intrincados e te dará a possibilidade de realizar todos os desejos dos humanos. Tome cuidado, pois o domínio desses conhecimentos podem te conduzir à prática da mentira, à falta de escrúpulos e o desequilíbrio mental.
A oitava porta –Ọ̀kànràn Méjì
Representa o poder da palavra do ser humano.
No oitavo quarto deverá solicitar a permissão de Ọ̀kànràn Méjì para conhecer o poder da fala humana, que infelizmente é muito mais usada na prática do mal do que para o bem, e o encadeamento das forças. Este guardião te falará em muitas línguas e de sua boca só ouvirá lamúrias. Aprende depressa e depressa foge deste local, onde imperam a falsidade e a traição.
A nona porta – Ògúndá Méjì
Representa os malefícios da corrupção e da decadência no ser humano.
Diante da nona porta, pedirá permissão ao seu guardião, Ògúndá Méjì para conhecer a corrupção e a decadência, que podem levar os seres humanos aos mais baixos níveis de existência. Naquele quarto, encontrará os vícios que assolam a humanidade e que a escravizam em correntes inquebráveis. Verá o assassinato, a ganância, a traição, a violência, a covardia e a miséria humana, brincando de mãos dadas com muitos infelizes que se tornam seus servidores.
A décima porta – Ọ̀sá Méjì
Representa o poder do fogo e da influência dos astros no ser humano.
No décimo aposento deverá apresentar reverências a uma poderosa feiticeira, cujo nome é Ọ̀sá Méjì. Ela vai contar o poder que a mulher exerce sobre o homem e o porquê deste poder. Conhecerá seres poderosos que praticam o bem e o mal, denominados Ajès que vão lhe oferecer seus serviços maléficos. Caso aceito fará de você o mais poderoso e o mais odiado ser da face da Terra.
Aprenderá a representação do tempo, a dominar o fogo, a utilizar a influência dos astros sobre o que acontece no mundo. Saberá das relações entre o sol e a Terra e a Terra e a Lua, principalmente a influência da Lua sobre os seres vivos. Cuide para que estes segredos não te transformem em um feiticeiro maldito.
A décima primeira porta – ÌkàMéjì
Representa o mistério da reencarnação e o domínio sobre os espíritos.
Bata agora com o seu Irofá na décima primeira porta e a voz do guardião Ìkà Meji lhe dirá onde os peixes povoaram os mares, o gigante em forma de serpente te fará estremecer. Saúde-o respeitosamente e solicite dele a permissão para conhecer o mistério que envolve a reencarnação, o domínio sobre os espíritos Àbìkù que nascem com o destino de uma vida curtíssima. Aprenda a dominar este segredo e desta forma poderá livrar muitas famílias do luto e da dor.
A décima segunda porta – Ọ̀túrúpọ̀n Méjì
Representa os segredos da criação da Terra.
Esta porta te reserva sustos e surpresas sem fim. Seu guardião se chama Ọ̀túrúpọ̀n Méjì é do sexo feminino. Possui forma arredondada, mas se parecendo com uma grande bola de carne quase disforme. Trata-se de um gênio muito poderoso que poderá lhe revelar todos os segredos que envolvem a criação da Terra, além de te ensinar como obter riquezas inimagináveis. Aprenda com ele o segredo da gestação humana e a maneira como evitar abortos e partos prematuros. Depois parta respeitosamente em busca da próxima porta.
A décima terceira porta – Òtùrá Meji
Representa o pleno poder sobre a matéria, a força mágica.
Bata com cuidado e muito respeito, neste quarto reside um gigante chamado Òtùrá Meji, que costuma comunicar-se de forma íntima e constante com a energia da criação. Aprenda então como nasceu à raça humana, o domínio do homem sobre todos os animais e como é possível separar as coisas.
Domine os mistérios de dissociar os átomos, adquirindo assim pleno poder sobre a matéria. Aprenda também a utilizar a força mágica que existe nos sons da fala humana, mas usa esta força terrível com muita sabedoria.
A décima quarta porta – Ìrẹtẹ̀ Méjì
Representa o poder dos segredos dos espíritos da Terra.
Já diante da décima quarta porta, irá se deparar com Ìrẹtẹ̀ Méjì, que nada mais é do que o próprio espírito de Ilé, a terra. Faça com que desvende seus mais íntimos segredos, aguarde-o e preste lhe permanente reverência e sacrifício. Saiba como ir e voltar do reino de Iku. Contate por seu intermédio os espíritos da terra, “Onile”, transformando-os em seus aliados. Aprenda com ele o poder da cura.
A décima quinta porta –Ọ̀sẹ́ Méjì
Representa os males físicos do ser humano.
Na décima quinta porta será recepcionado por Ọ̀sẹ́ Méjì, que irá te ensinar sobre degeneração, decomposição, doenças, perdas e putrefação. Aprenda que é perdendo que se ganha, siga sempre pelo caminho mais modesto.
Aprenda a sanar estes males e saia daí o mais depressa possível para não ser também vitimado por tanta negatividade.
A décima sexta porta – Òfún Méjì
Representa a união dos poderes dos outros 15 Odùs de Ifá.
Finalmente a décima sexta porta, o último dos obstáculos que te separam da sua desejada musa. Aí reside Òfún Meji, o mais velho e terrível dos 16 guardiões, aquele que ressuscita os mortos, saúde-o com temor, dizendo “Epa Imole” só assim poderá aplacar a sua Ira. Contemple-o, mas não o encare, observe que ele não é como os outros que você já conheceu durante a caminhada. É a reunião de todos os demais que nele habitam e que nele se dissipam somente de forma ilusória. Conhecê-lo é conhecer todos os segredos do Universo.
“Se for esta a sua busca, então você encontrou a “Sabedoria”, leve-a consigo até a eternidade”.
Autoria: Babalawo Ifalola Egungbade