terça-feira, julho 2, 2024
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Ṣàngó O deus da justiça na Religião Yorùbá

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Escultura em madeira: Obra executada por Lamidi Olonade Fakeye (1928–2009).

Ṣàngó é um dos Òrìṣà mais conhecido no panteão yorùbá, sendo seu nome e suas histórias muito contadas tanto na África, como em diversos países do mundo. É o deus da justiça, do trovão, do fogo e possui uma forte ligação com o culto ancestral (Egúngún). Ṣàngó não tem medo da morte, é um bravo guerreiro e foi em sua encarnação um grande conquistador de diversos povos no Àyié (Terra). Na mitologia yorùbá, Ṣàngó foi esposo de Oṣun, Oyá e Ọbà.

Em alguns lugares da África, Ṣàngó é considerado a encarnação do deus primordial do sol, raios e tempestades. Assim seria a encarnação de Jakutá, que é considerado a mão de Olódùmarè que castiga. Representa o poder da justiça de Olódùmarè. Assim, Ṣàngó é considerado como um Òrìṣà Egúngún (divindade ancestral) por ser o Òrìṣà executor divino e Egúngún por ter encarnado no Àyié como homem. Ṣàngó foi criador do culto de Egúngún e o primeiro ojé (responsável pelo culto aos antepassados e ancestrais).

 

ELEMENTOS LIGADOS A ṢÀNGÓ

 

Imagem: Machado de Ṣàngó em madeira.
Origem: Nigéria – África.

Machados

Conhecido em yorùbá pelo nome de ọṣè.
É um machado de dois gumes. Geralmente feito em madeira, mas pode ser encontrado também em cobre, latão, bronze ou outros materiais semelhante ao Lábris.

Imagem: Machado de Ṣàngó em madeira. Origem: São Paulo – Brasil.

Para a religião yorùbá, a representação de símbolo da justiça não é uma balança, e sim, ọṣè.

Os machados usados no culto podem conter variações dependendo do local onde foi produzido e qual seria a tradição. Na tradição de Ifá, encontramos nitidamente mudanças gigantescas tanto nos machados, como também nas lendas e assentamentos que os diferenciam do Candomblé brasileiro.

 

Sérè

Imagem: Centro Cultural Brasil África.

Conhecido no Brasil pelo nome de xére. É um instrumento sagrado usado por aqueles que são iniciados no culto de Ṣàngó. O sérè costuma ser utilizado durante as cerimônias religiosas e nos assentamentos.

A utilização tem como objetivo principal de despertar as forças deste Òrìṣà.

Na cultura africana, o sérè é feito de cabaça e a cor costuma ser a mesma do Òrìṣà. Conforme o demonstrativo pelo ọmọ Ṣàngó – Eduardo Henrique, que na foto se encontra segurando um sérè em sua mão direita.

Imagem: Centro Cultural Brasil África, localizado em São Paulo – Brasil.

No Candomblé o instrumento de invocação é um pouco diferente da África, o sérè não é feito de cabaça. Costuma ser de forma oval e dependendo da interpretação da tradição familiar, poderá ser feito de aço, cobre, entre outros. Alguns preferem com a ponta do cabo em madeira, e até enfeitam com búzios e outros com miçangas.

De uma forma bastante descomplicada, o sérè é um chocalho, alguns costumam usar entoando cantigas, rezas e outros até mesmo depositam este instrumento no assentamento de Ṣàngó.

Òrìṣà guerreiro

Imagem: Centro Cultural Brasil África.
Lado direito: Bàbáláwo Alberto Junior.
Lado esquerdo: ọmọ Ṣàngó – Eduardo Henrique.

 

Ṣàngó é uma divindade que possui o poder de domínio do fogo, vulcões e faíscas. Em muitas histórias na tradição oral conta que muitos de seus inimigos se rendiam antes mesmo de lutar porque ele assustava somente com o olhar e sua respiração que virava fogo e tinha o costume de cuspir fogo.

Sempre estava acompanhado de seu ọṣè (machado de duas lâminas) que é sua arma de guerra.

 

 

Imagem: Flora Xangô. Ṣàngó feito em madeira.

Em algumas das histórias mais conhecidas Ṣàngó era filho de Òrànmíyàn, um valoroso guerreiro, cujo corpo era preto à direita e branco à esquerda. Homem valente à direita e à esquerda.
Òrànmíyàn sempre muito corajoso e forte em casa e nas guerras, foi o fundador do Reino de Ọyọ, na terra dos yorùbás.
Durante suas guerras, ele passava sempre por Empé, em território Tapá, também chamado de Nupê. Em Elempê, o rei da localidade fez uma aliança com Òrànmíyàni e deu-lhe, também, sua filha em casamento.
Desta união nasceu este filho vigoroso e forte, chamado Ṣàngó.
Durante sua infância em Tapá, Ṣàngó só pensava em encrencas. Encolerizava-se facilmente, era impaciente, adorava dar ordens e não tolerava reclamação. Ṣàngó só gostava de brincadeiras que envolvia guerras e brigas.
Comandando os pivetes da cidade, ele ia roubar os frutos das árvores. Crescido, seu caráter valente o levou a partir em busca de aventuras gloriosas. Ṣàngó tinha um ọṣè (machado de duas lâminas); tinha, também, um saco de couro, pendurado no seu ombro esquerdo.
Nele encontravam-se os elementos do seu poder (àṣẹ),
aquilo que ele engolia para cuspir fogo e amedrontar seus adversários, e a pedra de raio com as quais ele destruía as casas de seus inimigos.
O primeiro lugar que Ṣàngó visitou chamava-se Kossô.
Chegando no local, as pessoas assustadas disseram:

Pedra: Edun Ara (Formações rochosas de diferentes tamanhos que se criam ao trovão atingir o solo).

“Quem é este perigoso personagem?”
“Ele é brutal e petulante demais!”
“Não o queremos entre nós!”
“Ele vai atormentar-nos!”
“Ele vai maltratar-nos!”
“Ele vai espalhar a desordem na cidade!”
“Não o queremos entre nós!”
Mas Ṣàngó os ameaçou com seu ọṣè e sua respiração virou fogo.
Ele destruiu algumas casas com suas pedras de raio.
Todo mundo de Kossô veio pedir-lhe clemência, gritando:
Kabiyei Ṣàngó, Kawo Kabiyei Ṣàngó Obá Kossô!
“Vamos todos ver e saudar Xangô, Rei de Kossô!”

Quando Ṣàngó tornou-se rei de Kossô, ele pôs-se à obra.
Contrariamente ao que as pessoas desconfiavam e temiam, Ṣàngó fazia as coisas com alma e dignidade. Ele realizava trabalhos úteis à comunidade.
Mas esta vida calma não convinha a Ṣàngó. Ele adorava aventuras e viagens.
Assim, partiu novamente e chegou à cidade de Irê, onde morava Ògún.
Ògún o terrível guerreiro e poderoso ferreiro.
Ògún estava casado com Oyá, senhora dos ventos e das tempestades.
Ela ajudava Ògún em suas atividades.
Toda manhã, Oyá o acompanhava à forja e o ajudava, carregando suas ferramentas, pois apresentava força masculina e mesmo sendo vaidosa, era muito trabalhadora, ela, ainda, que acionava os sopradores para atiçar o fogo.
O vento soprava e fazia: fukú, fuku, fukú.
E Ògún batia sobre a bigorna: beng, beng, beng…
Ṣàngó gostava de sentar-se ao lado da forja para ver Ògún trabalhar.
Algumas vezes, ele olhava para Oyá.
Oyá, também, espiava furtivamente Ṣàngó.
Ṣàngó era vaidoso e cuidava muito da sua aparência, a ponto de trançar seus cabelos como os de uma mulher. Ele fez furos nos lobos de suas orelhas, onde pendurava argolas. Usava braceletes e colares de contas vermelhas e brancas.
Que elegância!
Muito impressionada pela distinção e pelo brilho de Ṣàngó,
Oyá fugiu com ele e tornou-se sua primeira esposa.
Ṣàngó voltou por pouco tempo a Kossô, seguindo depois, com seus súditos, para o reino de Oyó, o reino fundado, antigamente, por seu pai Òrànmíyàn (Oraniã).
O trono estava ocupado por um meio-irmão de Ṣàngó, mais velho que ele, chamado Dadá-Ajaká – um rei pacífico, que amava a beleza e a arte.
Ṣàngó instalou-se em Oyó, num novo bairro que chamou de Kossô.
E conservou, assim, seu título de Obá Kossô – “Rei de Kossô”.
Ṣàngó guerreava para seu irmão Dadá.
O reino de Oyó expandia-se para os quatro cantos do mundo.
Ele se estendeu para o Norte, Sul, Leste e se estendeu para o Oeste.
Ṣàngó, então, destronou seu irmão Dadá-Ajaká e fez-se rei em seu lugar.
Kabiyei Ṣàngó Alafin Oyó Alayeluwa!
“Viva o Rei Ṣàngó, dono do palácio de Oyó e Senhor do Mundo!”
Ṣàngó construiu um palácio de cem colunas de bronze.
Ele tinha um exército de cem mil cavaleiros. Vivia entre suas mulheres e seus filhos. Oyá, sua primeira mulher, era bonita e ciumenta.
Oṣun, sua segunda mulher, era coquete e dengosa.
Ọbà, sua terceira mulher, era robusta e trabalhadora.

Sete anos mais tarde, foi o fim do seu reino:
Ṣàngó, acompanhado de Oyá, subiu à colina Igbeti, cuja vista dominava seu palácio de cem colunas de bronze. Ele queria experimentar uma nova fórmula que inventara para lançar raios.
Baoummm!!!
A fórmula era tão boa que destruiu todo o seu palácio!
Adeus mulheres, crianças, servos, riquezas, cavalos, bois e carneiros.
Tudo havia desaparecido fulminado, espalhado e reduzido a cinzas.
Ṣàngó, desesperado, seguido apenas de Oyá, voltou para Tapá.
Entretanto, chegando a Kossô, seu coração não suportou tanta
tristeza.

Ṣàngó bateu violentamente com os pés no chão e afundou-se terra adentro. Oyá, solidária, fez o mesmo embora, Oṣun e Ọbà transformaram-se em rios e todos tornaram-se Òrìṣà.

Ṣàngó, Òrìṣà do trovão,
Kawo Kabiyei le!

Oyá, Òrìṣà da tempestade,
Êpa Heyi Oyá!

Oṣun, Òrìṣà das águas doces,
Orê Yeyê ô!

 

 

 

REFERÊNCIAS:
Adekunle, Otunba, Ifá Filosofia e Ciência de Vida. 1.ed. São Paulo, 2005.
Fatumbi, Pierre, Lendas Africanas dos Orixas . 1.ed. Solisluna Design. Bahia, 2019.
Prandi, Reginaldo, Mitologia dos Orixás. 1.ed. Companhia das Letras. Rio de janeiro, 2000.

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