Concebido há mais de 3 mil anos, com base no conceito de yin e yang, este oráculo chinês percorreu os séculos ajudando os homens em sua autodescoberta. Veja como desvendar os segredos do I Ching e conhecer mais sobre si mesmo
Texto • Redação
Assim como na natureza, a vida também tem suas estações. Há tempos de despontar e se encher de forças para crescer e produzir e tempos de se recolher, diminuir a atividade e esperar o inverno passar. E descobrir quais são as primaveras, verões, outonos e invernos da vida é um desafio. Mas, seja para uma dúvida corriqueira (como trocar ou não de carro) ou em decisões importantes (como deixar um emprego, partir para uma nova carreira, mudar para outra cidade, ter um filho…), o I Ching tem uma resposta.
E ela não é uma simples indicação ao acaso, do tipo “faça isso” ou “faça aquilo”. “Pelo I Ching, é possível aprender a ver a vida sem o maniqueísmo das coisas boas ou más, e sim pelos aspectos obscuros e introspectivos ou de expansão e crescimento, analisando as circunstâncias com menos julgamento e mais discernimento”, explica Wagner Canalonga, professor de I Ching da Sociedade Taoísta do Brasil.
O I Ching, ou Livro das Mutações, é uma das obras mais antigas da literatura mundial com cerca de 3 mil anos de história. Nele estão as raízes das duas principais vertentes da filosofia chinesa: o confucionismo e o taoísmo. Usado tanto como oráculo ou como objeto de estudo, o I Ching é considerado um tratado das mutações, baseado no conceito de yin e yang. Segundo os chineses, nesta obra estão sintetizadas todas as leis que regem as transformações. “O oráculo nos ajuda a entender melhor a circunstância em que vivemos. Porque tudo tem o lado yang, ou seja, os aspectos lógicos e os que estão evidentes, e o lado yin, obscuro, misterioso. Pelo I Ching temos uma visão mais ampla para sabermos se uma situação ou decisão é favorável ou não”, afirma Canalonga.
Amigo para todas as horas
O principal atributo do I Ching é nos ajudar a lidar com as constantes mudanças que ocorrem em nossas vidas. Pela capacidade de apontar a essência das situações, o I Ching é utilizado por muitas pessoas quando estão diante de momentos importantes, que implicam decisões. É mais ou menos como ter um grande amigo íntimo, sempre pronto a escutar nossos problemas e a nos dar conselhos. Mas a lição mais importante que o Livro das Mutações nos traz é a de que nem sempre é hora de agir – temos os momentos certos para avançar, expandir, mudar ou crescer e o tempo de recuar, se recolher e esperar. Tanto o oráculo como o estudo do I Ching nos ajuda a interpretar melhor estes momentos.
Quantas vezes não ficamos angustiados persistindo em algo que não dá certo ou simplesmente não sai do lugar, está estacionado? “Este é um importante sinal de que não é a hora certa. Se as portas estão fechadas, é melhor recuar e rever. Não adianta ficar angustiado tentando vencer as forças do Céu e da Terra. É energia jogada fora”. Por outro lado, também é preciso saber o momento de agir. “Nem sempre o yang (aspectos lógicos) está evidente e não há segurança quanto à clareza da decisão. O I Ching também ajuda a mostrar esses aspectos”, orienta Canalonga.
A mesma natureza que oferece exemplos práticos de constância, persistência e nos assegura que amanhã o mundo continuará no mesmo lugar e terá a mesma conformação, ensina outra lição que soa quase paradoxal: duradouro não é sinônimo de estanque. As coisas se perpetuam, pregam as filosofias orientais, apenas porque são constituídas de partes mutáveis. É a transformação que torna as coisas permanentes. Por exemplo: um casamento será duradouro somente se passar pelas mudanças naturais que ocorrem nos relacionamentos. Se um mudou e o outro não, o casamento acaba. Tudo em nosso corpo cresce simultaneamente. Se uma parte ficar imutável e deixar de se desenvolver, afetará o todo.
A natureza sempre repete o caminho natural. Podemos aprender com ela que tudo é um processo, que podemos ser mais felizes se seguirmos o fluxo natural das coisas, ou seja, se não tentarmos reter o que precisa ser transformado. A máxima chinesa “sempre a primavera, nunca as mesmas flores” sintetiza o delicado e sutil relacionamento entre o mutável e o imutável no Universo e em nossa vida.
Como uma onda
Assim como as ondas no mar, a vida traz e leva coisas, pessoas e situações. E é neste movimento natural de ir e vir que crescemos. A lição que as ondas nos trazem é a do desapego. No balanço das ondas, entre uma que vem e outra que vai, encontramos espaço para a renovação. Querer apenas receber e acumular provoca o desequilíbrio das energias yin (concentração) e yang (expansão).
Este movimento não está presente apenas no mar. Está na nossa respiração: inalamos o ar, que fica retido e é absorvido, e em seguida expiramos, colocamos outro ar para fora e reiniciamos o processo. Noite e dia, movimento e repouso são outras demonstrações da presença do yin-yang na Terra. E nada é inteiramente bom ou mau, preto ou branco, porque cada um destes movimentos se inicia em seu oposto. Segundo os chineses, a noite começa ao meio-dia, quando o sol começa a declinar. Da mesma forma, o dia inicia a partir da noite.
São muitos os exemplos de equilíbrio e flexibilidade que a natureza nos mostra. Um fenômeno tão natural como os rios que correm para o mar é uma lição de adaptabilidade. As águas mudam de curso, sempre por onde é mais fácil, e vão moldando o trajeto por onde passam. Essas alterações de direção também fazem parte da vida e ensinam a não resistir às transformações, a não querer que tudo seja sempre da maneira como imaginamos. Muitas vezes, o que nos atrita com a vida é querer que tudo dure para sempre. Quando paramos de resistir às mudanças naturais da vida, entramos num fluxo de paz e tranqüilidade.
Usando o poder do oráculo
A maneira mais fácil para os leigos é o método das moedas. O primeiro passo é escolher três moedas iguais e colocá-las próximas a objetos pessoais do consulente para receberem as energias de sua realidade cósmica. Em seguida, determine qual lado da moeda corresponde ao elemento yin e qual representa o yang. O lado que corresponde ao yang terá valor três e o lado yin, valor dois. Formule uma pergunta clara e sacuda as moedas pensando na questão. Jogue uma vez as moedas, vamos supor, que as três moedas caiam com o lado yin voltado para cima. Então, você vai somar estes valores (2+2+2=6). Jogue mais cinco vezes, anote os valores e o resultado de cada soma. No total, as moedas devem ser lançadas seis vezes. Agora com os seis resultados em mãos, transforme cada um deles em um símbolo. Assim, para os resultados pares, corresponda linhas partidas (yin) e para ímpares, linhas inteiras (yang).
Para ficar mais fácil, acompanhe o exemplo:
Determinamos que cara é yin, portanto, valor 2, coroa, então, é yang, com valor 3.
Jogo 6 (cara/cara/coroa)
2+2+3=7 ________
Jogo 5 (coroa/coroa/coroa)
3+3+3=9 ________
Jogo 4 (coroa/coroa/cara)
3+3+2=8 ___ ___
Jogo 3 (cara/coroa/cara)
2+3+2=7 ________
Jogo 2 (cara/cara/cara)
2+2+2=6 ___ ___
Jogo 1 (cara/cara/cara)
2+2+2=6 ___ ___
Resultado: Hexagrama 53 – Chien: Desenvolvimento
Lembre-se: some os valores das moedas e desenhe a linha apropriada (números pares, linhas interrompidas; números ímpares, linhas inteiras). Para consultar o significado de cada hexagrama, além das várias edições do I Ching já lançadas no Brasil, você pode acessar sites, como www.uol.com.br/iching, que trazem tabelas e textos detalhados destes símbolos.
O yin e o yang
Inicialmente o I Ching era uma coleção de signos com fins oraculares, que partiam das simples alternativas “sim” e “não”, simbolizadas, respectivamente, por uma linha inteira e uma interrompida. Ao longo do tempo, o oráculo foi evoluindo para representações mais complexas, integradas por duas, três, até finalmente alcançar seis linhas.
Como as situações apresentadas pelas alternativas “sim” e “não” eram impossíveis de ser concebidas como rígidas e isoladas umas das outras, as linhas básicas passaram automaticamente a simbolizar as contradições da própria natureza, as tensões inerentes a todos os processos sempre manifestos na alternância de luz e escuridão, masculino e feminino, aparecimento e desaparecimento das coisas.
Assim nasceu a concepção das duas forças originárias da natureza, denominadas yin e yang, representando o mundo dos contrários. Originalmente, yin significava a sombra – o lado norte da montanha e o lado sul do rio, onde a posição do sol criava a escuridão e a sombra. Yang representava onde o sol declina – o lado sul da montanha o lado norte do rio. Os princípios de “luz” e “trevas” passaram então a simbolizar todas as polaridades em suas diversas combinações, sendo aplicada a todos os campos da vida.
A linha interrompida (yin) passou a significar frio, maciez, contração, umidade e princípio feminino da vida; e a linha inteira (yang) veio a representar calor, vigor, expansão, secura e o princípio masculino da vida. Em determinadas situações, por exemplo, o consulente pode ser aconselhado pelo I Ching a tomar atitudes mais yin (mais passivas), e em outras, mais yang (mais ativas).
Fonte: Triada.com.br