terça-feira, julho 2, 2024
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O Rei do Pano Branco

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onheça fatos super interessantes sobre um dos Òrìṣà de extrema importância na Religião Yorùbá.

• Texto – Awo Ifá Leké Eduardo Henrique Costa

No Brasil conhecemos pelo nome de Oxalá (em yorùbá: Òrìsànlá) e Obatalá (em yorùbá: Obàtálá) usados para se referir a um Òrìṣà de alta hierarquia, um dos mais antigos e um ser grandiosamente de pureza que não há palavras para defini-lo completamente. Ợbàtálá também conhecido como Ọbanlá (O Grande Rei), Òrìșàlá (A Grande divindade), Óòşààlá Òsèèrèmagbò e Òrìşà Igbowuji, é uma divindade de suma importância dentro da cultura yorùbá. Sua presença se estende por todas as terras yorùbá da Nigéria a República do Benin na África ocidental e também na diáspora yorùbá que inclui países como Brasil, Cuba, Trinidad e Tobago, Estados Unidos, Porto Rico, Panamá, México, Espanha e até a Inglaterra.

Festival na Nigéria.
Visão no Culto de Ọ̀rúnmìlà-Ifá

Dentro das crenças de Ifá, Ọ̀rúnmìlà é o Òrìṣà da adivinhação, sabedoria e até mesmo conhecimento divino, tendo como prática o uso de oráculos para consultá-lo em busca de orientações ou aconselhamentos. Obàtálá, por sua vez, ocupa uma posição de destaque, pois é considerado um dos dezesseis principais Òrìṣà Funfun (Divindades brancas que ocupam posição especial na cosmologia de Ifá).

Os Òrìṣà(s) Funfun são associados à cor branca e representam aspectos espirituais elevados, na pureza e criatividade. Ợbàtálá é especialmente venerenado como o Òrìṣà da criação e do desenvolvimento humano.

Na mitologia yorùbá, Ợbàtálá que é filho de Olódùmarè (Deus Supremo), recebeu o dever de criar a Terra e em algumas versões familiares ele teria concluído esta missão, e em outras quem teria concluído foi Odùduwà (seu irmão mais novo), cujo o nome significa “o grandioso que criou a resistência”.
Até os presentes dias atuais, os yorùbás acreditam que quando uma criança se encontra no ventre de sua mãe, é a energia de Ợbàtálá que se encontra formando a sua matéria física, por ele ser o Òrìṣà que moldou os seres humanos.
Os yorùbás também costumam contar que Ợbàtálá é o artista de Olódùmarè, dono da boa argila que cria várias formas de seres humanos, Ợbàtálá é considerado o deus da intelectualidade, aquele que ajuda o ser humano a ter capacidade de imaginar e criar (tornar real aquilo que imagina).

Ợbàtálá é ligado a pureza, e se encontra associado ao pano branco (Alá), não tão somente pela cor, mas o que o branco representa na Cultura Yorùbá, que é a pureza, do caráter, da conduta ou do comportamento, destacando uma grande importância na clareza e a pureza das intenções.

Na visão yorùbá, quando o ser humano vem para a Terra, ele se encontra com seu caráter branco e em volta de um lençol branco, conhecido como “Alá”, e são em suas intenções (quadros de pensamentos), suas atitudes, que irão corresponder se este pano estará limpo ou sujo. E após o desencarne, este lençol branco dirá para o Espiritual sobre o nosso merecimento de acordo com o que fomos em vida. E a presença do Culto de Ợbàtálá é extremamente importante na busca do que é limpo, puro e transparente.
Infelizmente vivemos num mundo, que não é um dos planetas mais evoluído que temos entre os espaços do Ọ̀rún, por isso encontramos pessoas falsas, que se escondem através de máscaras, praticam traições, mentiras, entre outros atos que mancham nosso estado de pureza e nos aproxima de seres espirituais conhecidos como Ajoguns. A palavra Ajogun literalmente significa, “guerreiros contra o homem”, é um nome coletivo para oito principais coisas ruins: ikú (morte), àrùn (doenças), òfò (prejuízos), ègbà (paralesia), òràn (tribulações), èpè (pragas), èwòn (prisão), èse (preocupações de qualquer tipo)… Os Ajoguns não precisam vir acompanhados de um espírito necessariamente, estas energias são atraídas de forma magnética pelos nossos atos, pensamentos e principalmente pela nossa vibração, é como aquele ditado “um homem que procura guerras, vive em guerras”, tudo é resultado de uma ação provocativa. Há aqueles que possui seu Alá tão sujo, que parecem não ter alma, e trocar as vestes é algo muito difícil em curto período, os africanos tem o costume de dizer que mais importante que seguir uma religião, é ter um bom caráter. Porque mesmo que o indivíduo não saiba da existência daquelas divindades, somente o fato de praticar bons atos, atrai boas respostas.

Nas cerimônias de Ifá, as referências a Ợbàtálá são frequentes, especialmente em rituais de iniciação e purificação, pois ele concedeu a espécie humana a capacidade de serem criativos e se expressarem artisticamente, na África é visto como Òrìṣà patrono dos artistas e artesãos.

Òrìsànlá costuma ser reverenciado em algumas famílias não só na África, há muitas referências nos cânticos na Santeria, Umbanda, Candomblé, entre outras religiões e até mesmo no Neo Xamanismo e Santo Daime que após chegarem a compreensão de que o Culto aos Òrìṣà é uma das práticas voltadas a cura e a natureza, resolveram agregar em suas correntes, embora ambos possui suas diferenças, há em comum a crença de que Òrìsànlá é o Òrìṣà da paz, sabedoria, pureza, criações artísticas e dos anciãos, Achar que apenas idosos devem cultuar esta divindade, é um grande erro! Pois até crianças e jovens podem cultuá-lo.

Em alguns rituais de iniciação em Ifá, pode-se ter o ato de oferecer ervas diversas como uma das oferendas ou elementos ritualísticos. É importante notar que as ritualísticas são altamente tradicionais e complexas, não sendo necessário apenas conhecimento teórico, requerendo muito mais práticas constantes e vivências, que variam de acordo com a tradição específica e a linhagem de sacerdotes, cada Bàbáláwo (Sacerdote de Ifá) segue uma formação rigorosa e é iniciado sempre por um outro Bàbáláwo mais experiente, aprendendo os segredos do oráculo, da medicina religiosa, além dos rituais e de toda a tradição em si.
Como em todas religiões e sistemas espirituais, o Culto de Ifá requer respeito, dedicação e compreensão profunda das tradições e crenças envolvidas. Toda tradição tem algo que lhe torna única, certas particularidades conhecidas como “fundamentos” que são riquezas que não se pode abrir mão, pois sem os fundamentos não há tradição religiosa.

No Àṣẹ Isese Lagba (tradição dos ancestrais), Òrìsànlá ocupa uma posição de destaque, ele é cultuado com grande devoção e respeito, considerado o pai de todos os Òrìṣà e o detentor de autoridade suprema. Suas características são representadas de forma variada nas diferentes tradições, mas em geral, o que encontramos em comum na maioria é a sua associação com a cor branca e a paz. Suas festas e cerimônias costumam envolver danças, cânticos e oferendas, onde os seus devotos buscam sua orientação, proteção e bênçãos. Na Tradição dos Ancestrais, Ợbàtálá é associado a valores morais elevados, como a justiça, bondade e tolerância, nas liturgias há muitas referências no contexto de Ìwà Pèlé (caráter).

Òrìṣà Ợbàtálá é considerado o guardião da ética, da transparência e luz. Muitos iniciados costumam invocar as suas forças em momentos de conflitos, buscando sua sabedoria e orientação para resolver questões dificultosas e promover a paz.

CULTO A OBATALÁ NO BRASIL

Seus adeptos usam colares de contas totalmente brancas e geralmente vestem-se de branco.
Sexta-feira é o dia da semana consagrado a este Òrìṣà. Porém em algumas religiões como a Umbanda, devido o sincretismo religioso com Jesus Cristo, muitos consagram o sétimo dia para culto, que seria no Domingo (o que vem fortemente de influência católica).

No Brasil, em específico no Candomblé, houve uma divisão de Ợbàtálá em dois nomes em que é cultuados de forma diferenciada, conhecidos como: Oxanguiã (em yorùbá: òṣà ògìnyán) e Oxalufã (em yorùbá: Òṣàlùfàn) ou Oxalufom (em yorùbá: Òsàlúfón). Na Nigéria e em algumas cidades, trata-se do mesmo Òrìṣà, inclusive na minha família tradicional acreditamos que ambos se interligam, porém em outras famílias Òṣàlùfàn seria filho de Ợbàtálá e foi rei em Efon, e òṣà ògìnyán também seria um filho de Ợbàtálá e foi rei em Ejigbo. O que é importante compreender é que entre o clã das divindades funfun ligadas à Ợbàtálá, existe poucas diferenças ritualísticas no Culto destes Òrìṣà de tão parecidas que são, dando a conotação de serem as mesmas, mas o que vemos é que os yorùbás não dão tanta importância a estas separações por acreditar que tudo está conectado uma a outra (sentido de clã).

É comum vermos cultos e reverências para Ợbàtálá e sua família na sexta-feira, devotos se vestindo totalmente de branco, evitando atos sexuais, bebidas alcoólicas, buscando um estado mais harmonioso. No Candomblé e na Umbanda, há várias práticas diferentes dependendo da vertente daquele terreiro, mas o que encontramos em comum é que ele é cultuado junto com outros Òrìṣà em diversas ocasiões, como em casamentos, nascimentos e rituais de passagens.

No campo literário brasileiro, há muitos pensamentos sobre arquétipos para definir os filhos de Obatalá, vejamos:
O arquétipo dos filhos de Òṣàlá é o de pessoas tranquilas, calmas, respeitáveis e dignas de confiança, no negativo podem se tornar impacientes (tudo dependerá do equilíbrio do Ori). Possuem forças de vontade e não mudam seus projetos facilmente, mesmo quando são alertadas, tem como característica a teimosia. Conseguem estabelecer entre as pessoas uma aura agradável de carinho e solidariedade.
São amáveis e pensativos, mas não costumam ser submissas. Gostam de impor sua vontade e opinião, tendo facilidade de argumentação. Centralizam as coisas em torno de si, o que muitas vezes pode sobrecarregá-las. Por conta da separação entre Oxalufã e Oxanguiã, há o pensamento de que as pessoas regidas pela energia mais velha de Oxalá (Oxanguiã) possuem tendências a ranzinzice e intolerância, enquanto no Oxalá mais novo (Oxanguiã), há um certo furor pelo debate e pela argumentação. Mas devemos lembrar que estes estudos são meros especulativos, pois como costuma agir a maioria, não quer dizer que todos são iguais, pois há um certo grau de evolução espiritual e alguns iniciados podem agir diferente que o outro, como eu costumo dizer “nada é perpétuo, tudo é evolutivo”.

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