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AMMA: ELA QUER ABRAÇAR TODO MUNDO

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Texto • Paula Bianca Oliveira
 

A solução para o choro de uma criança, um coração partido ou uma angústia desesperada. Quando as palavras não resolvem e os medicamentos já não são suficientes, a cura pode vir com um simples abraço, cheio de afeto e compaixão. É exatamente com esse gesto que a indiana Mata Amritanandamayi Devi, ou apenas Amma, vem mudando a vida de milhões de pessoas em todo o mundo.

Seu próprio nome, que significa “mãe divina infinita”, simboliza a importância que tem para seus seguidores. “O amor materno é a qualidade mais importante na Índia, onde as pessoas são ensinadas a ver suas mães como Deus”, explica a guru.

Como nenhum outro líder espiritual fizera antes, Amma oferece seu abraço a quem quer que seja em uma luta incessante contra o sofrimento e a dor. Desde a década de 70, quando começou a atender em sua própria casa, mais de 30 milhões de pessoas já foram abraçadas. “É uma corrente constante de amor que flui da Amma para todos os seres no Universo”, define a guru, que fala de si própria sempre usando a terceira pessoa.

Infância perturbadora

“Uma criança que sorriu ao invés de chorar.” Foi com essas palavras que os avós de Amma descreveram o momento de seu nascimento, no dia 27 de setembro de 1953, em Kerala, no sul da Índia. Seus pais, em uma espécie de escolha premonitória, lhe deram o nome de Sudhamani, que significa “jóia suprema”.

Morando em uma aldeia de pescadores, ela passou a dar sinais de sua divindade aos cinco anos de idade. Sem um guru ou guia, começou a proferir cantos devocionais (bahjans) e a realizar práticas espirituais. “Ela abria mão de qualquer atividade normal de uma criança para meditar durante horas”, conta Wilton Gayo Gama, psicólogo e coordenador do Núcleo de Meditação Amma São Paulo.

Sua trajetória altruísta também começou cedo. Aos nove anos, quando ainda cursava a segunda série, foi obrigada a parar de estudar para cuidar dos afazeres domésticos. Sua mãe adoeceu, e Sudhamani passou a ser tratada como uma serva por seus próprios familiares. Todos os dias acordava às três da manhã para limpar a casa, buscar água e dar de comer aos seus sete irmãos – tudo sempre sorrindo, cantando e sem fazer qualquer queixa.

Com um crescente senso de devoção mística e o desejo de aliviar o sofrimento dos outros, a jovem cuidava dos enfermos, idosos e das pessoas mais pobres de sua vizinhança. Muitas vezes, retirava comida do já reduzido estoque de sua família para alimentar quem nada possuía. Quando não havia o que oferecer, apenas abraçava fortemente os aldeões fazendo-lhes preces e orações.

Se por um lado seu comportamento atraía multidões em busca de curas e bênçãos, por outro gerava conflitos entre a jovem indiana e seus familiares. Eles simplesmente não entendiam nem aceitavam sua postura. Sudhamani passou a ser vista como uma transgressora de princípios, já que, em sua cultura, o abraço entre pessoas do sexo oposto não é aceito publicamente. Assim, ela foi apedrejada, esfaqueada e sofreu tentativas de envenenamento. Entretanto, nada foi capaz de inibir o florescer de sua compaixão. “O propósito de meu nascimento é sofrer pela ignorância dos outros”, dizia a seus pais ao ser maltratada.  

Milagres incompreendidos

Um dia, já na juventude, ela transfigurou-se. Ao manifestar aspectos e fenômenos associados a Krishna (deus hindu), passou a realizar curas milagrosas. Certa vez, quando recebia seus seguidores, um homem leproso aproximou-se. Por suas chagas exalarem um odor insuportável, todos os devotos saíram dali. A guru foi a única que permaneceu no lugar e chamou-o para perto de si. Em um gesto sublime, abraçou-o e lambeu todas as feridas de seu corpo. Sete dias depois, o homem estava curado.

Histórias como essa aumentaram a fama de Amma que, alguns anos depois, recebeu a manifestação da Deusa Mãe do Universo. “Sorrindo, a Divina Mãe tornou-se um corpo de luz e fundiu-se comigo. Daí em diante, eu nada reconheci como separado do meu próprio ser”, descreveu Amma em um de seus cantos devocionais. Depois de tal experiência, passou dias em êxtase, apenas proferindo cânticos e orações. Seus familiares e outros aldeões ficaram perplexos e a expulsaram de casa.

Vendo tanta miséria e sofrimento a sua volta, ela decidiu aprofundar-se na natureza dessas condições. “Amma percebeu que o sofrimento humano está enraizado na falta de amor”, conclui a líder espiritual que, na juventude, já estava determinada a tornar-se parte da solução oferecendo sua vida a essa causa.

Mãos (e braços) à obra 

Hoje, Amma vive em Vallikkavu, no sul da Índia, onde passa os dias disseminando sua interpretação do hinduísmo – religião predominante em seu país, caracterizada pelo politeísmo, a prática do yoga, a meditação e a crença na reencarnação.

Dormindo apenas duas horas por dia, ela não se cansa de ajudar e orientar aqueles que a procuram. Em sessões que chegam a durar até 20 horas, mantém o mesmo semblante alegre e sereno ao abraçar multidões, sem ao menos uma pausa para comer ou ir ao banheiro. Durante cada abraço ou “darshan” (nome dado à benção oferecida por uma pessoa santa), ouve-se ela dizer “mol, mol, mol…” (filho, filho, filho…) ou “mon, mon, mon…” (filha, filha, filha), como chama a todos. Depois, Amma lhes oferece um ou dois prasads (oferenda abençoada), como chocolates ou frutas.

Além de confortar milhares de pessoas e auxiliá-las em questões sobre o mundo material e espiritual, Amma desenvolve um amplo trabalho social, que movimenta o equivalente a 102 milhões de reais por ano. Por meio de doações e trabalho voluntário, ela mobilizou a construção de mais de 30 escolas, 25 mil casas populares, além do Aims Institute, um dos mais bem equipados hospitais da Índia. Entre suas obras mais importantes, também estão as universidades de tecnologia, medicina, administração, enfermagem e farmácia.

Por sua dedicação integral aos mais necessitados e pelo crescente número de seguidores, recentemente Amma foi reconhecida pela Organização das Nações Unidas (ONU) como “uma proeminente líder espiritual”. Já a imprensa norte-americana nomeou-a como “A Mãe da Compaixão” por conta das inúmeras obras humanitárias realizadas nos Estados Unidos, onde seu trabalho inspirou a criação de um projeto que alimenta a população carente em mais de 25 cidades.

No Brasil, a nova guru tem cerca de mil seguidores que, desde o ano 2000, desenvolvem as práticas espirituais prescritas por ela. Monges indianos vêm ao país com freqüência para ministrar cursos e palestras sobre Amma. Mensalmente, os seguidores reúnem-se no templo da cidade de Araruama (RJ) e, a cada quinze dias, na sede da capital paulista na Vila Mariana. É bem provável que, em breve, o número de brasileiros ansiosos por seu abraço multiplique-se – não é difícil imaginar o porquê.

Lições de mãe

“Deus não está sentado lá fora ou em algum lugar no alto do céu, mas dentro de nós mesmos.”

“Cada pessoa que vem a mim é como um espelho, no qual posso ver minha própria imagem, pois essa é sua verdadeira natureza. É como uma abelha: não importa se a flor é mais ou menos bela, colorida ou não; ela só enxerga o doce néctar.”

“Todas as sadhanas (práticas espirituais) são métodos para diminuir os pensamentos, além de aumentar a paz consigo mesmo e dar paz aos que estão a sua volta.”

“Quando transcendemos nossos egos, nossa vida inteira se transforma em uma oferta para o mundo.”

“A tentativa de realização através dos meios materiais nos cega para nossa realidade interior que, por si só, já é perfeita.”

“Ter metas é fundamental para nossa existência: encontrar uma boa companhia, ser feliz no trabalho, ser reconhecido em suas tarefas. Mas nunca devemos nos esquecer de ter outros valores, como honestidade, justiça e o fazer de forma correta, beneficiando a todos.”

“Viva o mundo com consciência. Cumpra suas obrigações, mas não conte com o mundo. Assim, você ajuda sua mente a manter-se equilibrada em qualquer situação que a vida lhe traga.”

“A vida é cheia de sucessos, erros, prazer e dor; essa é a natureza do mundo.”

“A espiritualidade só pode ser alcançada com quietude e silêncio.”

“É preciso ter contentamento. Afinal, de que adianta você conquistar tantas coisas se não é capaz de ter a paz ao usufruí-las?”

“Entenda quem você é. Conheça o Ser. Então, você poderá conduzir uma vida sem apegos a nada.”

“Nós deveríamos nos livrar de todos os desejos e adorar a Deus sem qualquer expectativa.”

“Temos de purificar nossas mentes, discernindo entre o eterno e o efêmero por meio da meditação.”

“O homem que despertou resolve todos os seus problemas por si mesmo e torna-se uma benção para a sociedade.”

“O abraço é a sobremesa”

Coração aberto e nenhuma expectativa. Com essa postura, o paulistano Marco Schultz foi à Índia, onde passou duas semanas no ashram de Amma e, por diversas vezes, recebeu seu darshan. “O abraço nos integra com o momento presente, que é exatamente como ela vive”, define Schultz.

Expoente do power yoga no Brasil, Schultz teve seu primeiro contato com Amma há cinco anos, quando assistiu a um vídeo sobre “uma tal santa dos abraços”. As cenas remetiam a um sentimento de acolhimento materno, mostrando uma troca de experiências que ia muito além do considerado normal. Desde então, a Divina Mãe sempre esteve presente dentro dele. Sua ida à Índia, no início deste ano, foi apenas “uma sede de ir à fonte”.

Convicto de que a experiência de receber o gesto carinhoso de Amma tem um poder transformador, Schultz diz que a ideia é voltar para casa e trabalhar a luz despertada naquele momento. “O abraço é a sobremesa. O banquete é estar permeado em sua energia e pureza, algo que a gente leva para a vida.” Para ele, a energia do abraço de Amma nada tem de místico ou fantasioso; é, na verdade, como um retorno àquilo que nos criou. “Ela tem o poder de nos fazer mais sensíveis, mais corajosos, mais humildes.”

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